Há cerca de duas semanas, uma vinheta chamou minha atenção: era uma chamada para o filme Tucker, uma obra cinematográfica de Francis Coppola. E que ainda não tinha assistido.
E é claro que não perdi. O filme é realmente fantástico, desses que nenhum fã de automóveis pode perder. Conta a história de um grande sonhador: Preston Tucker. Vendedor de automóveis e peças sonhava em fabricar o seu próprio carro. Fez os desenhos e partiu para a realização. O seu grande desejo era inovar, principalmente em relação à segurança.
O primeiro protótipo, feito as pressas, não era bem o que estava vendendo. Ainda assim, revolucionário. Com o sucesso, logo desenvolveram o modelo prometido, o que incluía pára-brisas ejetáveis, motor de 150cv capaz de atingir 80km/h a apenas 500rpm, dentre outras novidades, sendo a maioria delas voltadas à segurança. Como não poderia deixar de ser, logo veio o sucesso com o público.
Como não poderia deixar de ser, provocou uma reação das gigantes à época.
Logo começou o boicote, e as acusações contra Tucker e sua recente empresa foram parar no Tribunal. A conspiração foi forte. Chegou a ser comparado com Al Capone à época. E foi julgado inocente. Mas, tarde demais. O estrago já havia sido feito e a empresa nunca mais voltaria a se reerguer. Apenas 50 unidades (além do protótipo) chegaram às ruas.
Ao final do julgamento, no encerramento do filme (sim, já contamos o final), mostra Tucker com um desenho. Quando o questionam, ele diz que planeja vender geladeiras populares.
Não foi bem isso que aconteceu, na realidade. O sonho de Tucker de construir automóveis não morreu neste instante.
Tucker continou seu sonho aqui no Brasil. Na década de 50 a indústria brasileira estava apenas nascendo, e Tucker logo veio para cá, e iniciou o projeto de uma família de automóveis locais. Por cerca de cinco anos, Preston discutiu seriamente a possibilidade de produzir carros no Brasil. Instalou um escritório em Copacabana, no Rio de Janeiro, e manteve contato permanente com possíveis sócios, como o ex-governador paulista Adhemar de Barros, um dos políticos mais influentes daquele período no país. O primeiro automóvel, e único que chegou a ser planejado era o Carioca. Ainda baseado no Tucker original, mas muito mais leve e com motores de 4 cilindros (e não o gigantesco motor de helicóptero do 48), mais adequados a nossa realidade, sendo econômico, com desenho esportivo e com inovações já testadas no Torpedo.
Para fazer essa campanha em prol do Tucker brasileiro, um Tucker original foi importado. Era preto, e foi fotografado muitas vezes pelas ruas do Rio de Janeiro. Não se sabe se era de Preston Tucker ou de algum parceiro do projeto – só se sabe que era a grande propaganda para tentar apoio.
Mas Tucker não resistiu. Ainda em 1956, logo no início do projeto, faleceu no Rio de Janeiro, em decorrência de um câncer no pulmão.
E o projeto não avançou. A família que incluiria um jipe, sedan, esportivo, acabou por ficar nos esboços. Segundo os familiares de Tucker, eles têm muitos detalhes sobre esse Carioca e sua linha, porém ainda a serem revelados em futuras convenções dentre os amantes da marca.
Aquele Tucker usado para as propagandas foi parar numa revenda de São Paulo, pouco tempo depois. Agop Toulekian o comprou, e passou quase duas décadas com o veículo. Impressionante é o fato do carro nunca ter apresentado problemas mecânicos, segundo o filho do antigo proprietário. O grande problema era a parte elétrica. Segundo ele uma vez o painel chegou a pegar fogo.
Foi vendido para Orlando Bombarda e logo depois para Eduardo Matarazzo, que o cedeu para Robert Lee, que montou o primeiro museu do automóvel do Brasil, em Caçapava (SP). Encontra-se hoje em estado deplorável. O motor original (traseiro), foi substituído por um dianteiro e hoje se encontra sem este. Para aplicar o motor dianteiro, o farol foi retirado e “substituído” por uma ventoinha. Há ferrugens por todos os cantos do automóvel. As fotos são de 2004.
O motor original encontra-se no Museu de Eduardo Mattarazzo.
A coleção, além desse raríssimo automóvel conta com outras preciosidades, como Maseratis de competição da década de 30 e outros. Após a morte do fundador do museu o projeto não teve continuidade pela família. Hoje tudo está sendo discutido na justiça, enquanto os veículos deterioram e têm suas peças roubadas.
Um Tucker hoje está avaliado entre 300 e 500 mil dóllares. O exemplar brasileiro é um dos três originais que não têm condições de rodar. Um foi completamente destruído, outro está com um colecionador que adoeceu antes de terminar a restauração e o terceiro é o nosso. Só existem dois fora dos EUA, este de Caçapava (SP) e o que está no Museu da Toyota, no Japão.
O que seria da nossa industria se os Tucker viessem a entrar em produção aqui, ainda não se sabe. Mas temos a certeza que sua memória têm de ser preservada por aqui. Seu sonho de fazer carros modernos, seguros e acessíveis têm de servir de exemplo a nossos fabricantes.
O modelo encontra-se sem o motor, que felizmente está em boas mãos
Texto: Guilherme Lopes
Fonte: Tuckerclub.org, Revista Quatro Rodas